27.7.09

queria assim

apressou o passo, quase correndo.
na esquina, encontraria o assassino
com as flores partidas e olhar piedoso.
queria assim...
"oi", abraço afetuoso
talvez beijo na boca
depois a lâmina fria
perfurando o coração.

26.7.09

fim do dia


e ali, perdida
entre os cães sem dono,
ela olhava para a frente
e via o mar solitário,
com sua imensidão
de água
e desesperança
.


24.7.09

uma lembrança indolor pelos melhores dias

silenciosamente, optou pela ausência de sentimentos. colocou 40 gotas na dose de gim e a melhor música dos smiths. disse que o amava e que seria pra sempre o seu único amor. acariciou os cabelos, preferiu primeiro fazê-lo dormir. cantou baixinho, cada palavra, cada verso... sussurrou... queria que assim fosse, uma lembrança indolor pelos melhores dias. não duvidava do seu amor e aquilo era tudo que a fazia feliz. mas a felicidade meu bem, nos momentos difíceis, era algo suspeito e complicado de se lidar.

19.7.09

cortina velha, suja, grades enferrujadas e esperanças juvenis

da janela, depois da cortina rasgada e suja, das grades enferrujadas, via fios elétricos com tênis, restos de pipas e esperanças juvenis penduradas e abandonadas. existiam árvores antigas, corroídas por cupim e paredes descascando. nos fins de tarde, quase sempre, podia ver o sol se por. com ele, a noite trazia velhos conhecidos e quase nunca sentimentos mais felizes. ela olhava pra baixo e agradecia, sempre, às grades enferrujadas por estarem ali nos piores momentos, quando a música ficava mais triste e os amores fortuitos da madrugada teimavam em ir embora. alguns, deixavam bilhetes de adeus, outros nem isso. nela, sobrava o hálito do vinho barato, o corpo maculado, a alma ainda mais dilacerada e as flores que nunca chegariam na hora do café da manhã.

16.7.09

audrey hepburn na janela de baixo

sonhava assim,
audrey hepburn na janela de baixo
cantando moon river.
do amor, queria que fosse eterno,
único e indivisível.
poderia doer, até rimava.
mas o olhar seria só dele,
os passos da dança no salão,
o gole de cerveja quente,
a marca do batom vermelho no copo,
a respiração egoísta
entre a nuca e a omoplata.
procurava nos filmes,
nos romances de jane austen
e nas músicas de nina simone.
sonhava assim, era pouco criativo.
toalha enrolada na cabeça
e um violão desafinado.
moon river / wider than a mile
i'm crossing you / in style some day
oh, dream maker.
então tocaria a campanhia
e o entregador de pizza
esboçaria um costumaz sorriso
simpático e sarcástico.
e aquela seria mais uma noite,
sem sono, sem amor,
sem audrey hepburn
na janela de baixo.

15.7.09

um pingo de chuva reticente, quase sem força

vodka orloff na mão direita e o controle na esquerda. entre um canal e outro, uma dose. enquanto isso, lá fora, um pingo de chuva reticente que teimava em correr livre do telhado até o asfalto velho e desbotado. uma vitrola, móvel surrado, decadente. "here is fruit for the crows to pluck, for the rain to gather, for the wind to suck...". ela gostava da billie, como gostava de sinatra na primeira fase e dos filmes de nicholas ray. não encontrara o homem da sua vida nem lembrava seus poetas preferidos. então restava pouco... entre um canal e outro, uma dose. enquanto isso lá fora, um pingo de chuva reticente, quase sem força.

12.7.09

frango assado, arroz e salada do almoço

disse que o amava, mais que tudo, que precisava dele para ser feliz e nem conseguia imaginar sua vida no futuro sem sua presença. porém, o boy talhado a ferro da academia balançava suas estruturas. disse assim, na lata. daí por diante uma série de confissões graves, outras nem tanto. ele ouviu, ouviu e ouviu. quando ela, cinquenta minutos depois parou de falar ele deu um leve sorriso. "terminou?". "acho que sim". ficou em silêncio, pensativo. cinco minutos. "não vai falar nada caralho?". "o que tem aí para jantar?". "frango assado, arroz e salada do almoço". "legal". ela deu um leve sorriso.

10.7.09

é assim que ela me faz bem

toda história de amor acaba mal. nem toda história de amor acaba mal. quase toda história de amor acaba mal. para ruth, nenhuma das alternativas.
para ela, não havia histórias de amor e, portanto, não poderiam acabar simplesmente pelo fato de nem começarem. ela sabia e por conta disso pouco esperava.
naquela manhã de domingo, como em outras, ela acordou com a sensação de que nem dormira. calçou os chinelos três números maior que o seu e só assim percebeu que não sabia onde estava.
olhou para a cama vazia e desarrumada, olhou para os lados... nada reconhecera.
saiu do quarto e andou pelo apartamento de paredes velhas, pintura decadente, inspiração pífia. pouca paixão, certamente. e tudo parecia ser extremamente previsível, os livros na estante derrubada, alguns cds e vinis, fitas k7.
aos poucos ruth foi lembrando como chegara até ali. tinha começado na sua recente porém intensa vida virtual. ruth não gostava. para ela, na virtualidade faltava paixão, de olhar nos olhos e ver a última piscadela da vítima agonizante, o sorriso amoroso da nova conquista, os dentes que trincam quando a raiva provocada é inapelável.
ele, ou talvez ela, deixara um bilhete e a porta aberta: "fui comprar cigarro, demoro pouco. por mim, melhor encontrar a casa vazia na volta porque é assim que ela me faz bem. beijos".