14.8.17

na casa da esquina


na casa da esquina, havia uma luz azul que acendia e apagava sempre que alguém pensava em morrer de amor. na casa da esquina havia um amor azul que apagava e acendia sempre que a luz pensava em morrer sem dor. certo dia joana apagou todas as luzes, matou todos os amores e rasgou os vestidos azuis. sempre preferiu lugares escuros, paixões efêmeras, vestidos pretos e uma morte indolor.

22.12.15

cartola e alguns versos

a saideira.
cartola e alguns versos.
o garçom que atravessa o corredor
carrega consigo a fúria
do touro diante do matador
no último suspiro.

audrey hepburn na janela, tolha na cabeça, violão.

duas ou três possibilidades...
não mais.
...
nunca mais.

alice

sim, alice sentia dor.
mas fazia questão de ser elegante nesses momentos,
ou quase sempre...
ou sempre.

!!!

e da última palavra fez o último desejo.

...

um estranho ruído dilacera meus pensamentos...

enorme, profundo, quase indolor

e ela queria mesmo que o dia não fosse hoje,
que a hora fosse outra,
que o tempo não existisse.
entre o que havia dito e o que queria ter dito
havia um abismo...
enorme, profundo, quase indolor.
esperou pelo sorriso que nunca veio,
pelo afago sempre negado.
cansou de esperar...

17.1.11

música ao fundo, poucos acordes, uma voz rouca feminina

1.
acordou.
havia uma música ao fundo.

poucos acordes, uma voz rouca feminina.

2.

foi até a geladeira em busca de amor...

um vinho de quinta pela metade, duas cervejas

e um queijo quase passado.

talvez até conseguisse ser feliz

foda mesmo era a música ao fundo.

3.
no chão da sala velhos papéis

e um vinil da patsy cline.

ligou o computador
,
tentou escrever algo,
deu a derradeira golada
na boca da garrafa.

4.
foda,
mesmo...
era a música ao fundo.

5.
voltou ao quarto, acendeu um cigarro,
ouviu o barulho que vinha da rua.
um casal discutia no banco da praça,
carros em alta velocidade,
o som da infelicidade
de quem ía e vinha.

6.
quando a música acabou
resolveu dormir.

7.
...

8.
acordou.
havia uma música ao fundo.

poucos acordes,
uma voz rouca feminina.

16.12.10

queria pouco agora

cada caixa com cada folha dos textos antigos,
dos cartões postais e cartas que nunca foram recebidas
representava um pouco menos dela em sua vida.
doía...
dor sincera aquela, lenta, arrastada e contida.
depois de tanto tempo e tantos desacertos,
aquele havia sido o definitivo.
no fundo, a sensação de ser o melhor caminho
era uma certeza que nunca queria ter tido.
mas assim foi... caixa por caixa,
até deixar completamente vazio
o último espaço que ainda o mantinha próximo
ao que não mais existia.
dali, parar no primeiro bar,
escolher alguma canção que falasse de amor e dor na jukebox
e beber até perder a noção e ficar entorpecido pelo passado.
talvez a garota legal do apartamento da frente
pudesse ser um sinal de que nem tudo
estava perdido.
queria pouco, um sorriso talvez
ou no máximo um ombro macio
pra adormecer em paz.
lady, cante uma canção pra mim, please.
...
queria pouco, agora.
poderia ser feliz com pouco, só isso.


para Van, que sempre quis pouco, como agora.

12.12.10

a possibilidade de um crime

joana via no rosto de cada um a possibilidade de um crime...
porque sempre imaginava o sentido da vida como uma incontrolável sucessão de crimes passionais.

2.12.10

palavras perdidas do velho buk












porque enquanto chovia e o dia acabava
,
ela caminhava imponente e sóbria
na avenida, entre os carros e a lama.
naquela segunda que amanheceu quente
e terminou fria ruth tinha feito pouco
ou quase nada.

o gosto de vodka vencido,
o mesmo disco arranhado de tom waits,
as palavras perdidas do velho buk
e o amor impossível da noite passada.

30.11.10

joana

joana não sabia mais se era real aquele sentimento
que tomou conta dela quando acordou
naquela manhã inusitada e chuvosa de abril.
dele não restava sequer o cheiro
ou as marcas no lençol desbotado sofrido de guerra.
o barulho de cada gota que corria pelas janelas
envelhecidas lhe parecia familiar.
nas poucas vezes em que foi feliz chovia,
como agora.







28.11.10

doce rotina

percebeu que no final de tudo
havia uma esperança
ainda que tardia de ser feliz um dia.
resolveu não arriscar
e optou por permanecer na tristeza
que vestia com elegância sua doce rotina.

11.10.09

crime passional nº 2 - espinha de peixe

gostava sempre do peixe torrado, fritinho tanto que ficava seco pra comer. caprichei naquele dia, traíra fresquinha comprada na bodega do cavalcante. ele, como sempre, chegou bêbado e fedendo da noite anterior. pegou com a mão, encheu de molho de pimenta e traçou a primeira com doses de cana. na segunda, entalou. começou tossindo... tossindo... e tossiu muito! espinha de peixe atravessada na garganta. foi ficando vermelho depois sem cor. caiu. terminei de ler o signo e cheguei perto pra ver se havia acabado. restava um olhar derradeiro esvazindo-se com o último suspiro. morreu, tadinho! enfiei o dedo na goela, tirei a bicha que tava atravessada. essa, haveria de guardar como lembrança. troféuzinho singelo porém sincero!

crime passional nº 1 - pudim de rapariga

dormia que roncava. primeiro uma, depois duas, três, quatro. na quinta se estrebuchava no sofá rasgado da sala feito peru com o pescoço torcido em véspera de natal. agora, morria aos poucos. a sexta gota do oléo cozido no ouvido esquerdo foi só pra ter certeza. e foi bem assim, sem culpa nem piedade. só por causa do pudim rejeitado na noite anterior. "garanto que se fosse da rapariga ele gostava. do meu, reclamou da pouca calda. bem feito! agora quero ver se tem pudim de rapariga no inferno."

29.9.09

esquinas perdidas, o assassino, a menina

numa dessas esquinas perdidas o assassino esperava pela vítima futura. o tênis azul com listras brancas apertava um pouco. no mais, o mesmo de sempre: calça jeans envelhecida, camiseta preta hering tamanho p e o mp4 com as canções de beth gibbons.
perto de uma dessas esquinas perdidas a menina caminhava pensando no futuro amor. o tênis vermelho no tamanho certo, jeans envelhecido colado no corpo e camiseta branca amélie poulain.
enquanto isso, a cidade anoitecia e o sol desistia de permanecer no alto, imponente. a lua vinha aos poucos, delicada e silenciosa enquanto a menina caminhava e o assassino, paciente, esperava.

5.9.09

doze suspiros

1. agora somente histórias mais calmas, a voz de hope sandoval e a lembrança distante quase sumindo do último olhar.

2. havia um tênis pendurado nos fios da energia elétrica e próximo a ele galhos de uma árvore com pouco tempo de vida. o cupim subia aos montes e cair era uma questão de tempo.

3. o velho par de sapatos talvez um dia tivessem sido calçados por alguém que, como ele, sonhara com uma vida de emoções parcas mas sinceras.

4. na quadra velha, quase sempre vazia, água da chuva acumulada que aos poucos virava lama.

5. ao longe, uma antiga canção de odair josé e, alguém feliz que cantava enquanto varria o chão provavelmente alheio.

6. ao redor, a velha estante repleta de filmes dos anos 40, vinis de cantoras negras depressivas e livros de virginia wolf.

7. sentia falta! saudade! sabia que ele não voltaria mas não conseguia conter o sobressalto de todas as manhãs quando, ao acordar, pensava ter sido um sonho.

8. então as lembranças voltavam ao poucos com a precisão de todos os fatos. morrer nunca seria uma coisa simples. ela sabia disso e sofria por ter a certeza.

9. e esperava cada dia passar, cada noite chegar para dormir e acordar novamente, pensando ter sido apenas um sonho.

10. e as músicas não eram mais suficientes, os comprimidos não surtiam efeito e o tempo passava sempre com maior lentidão...

11. sempre lento, lento...

12. ... até parar de passar um dia
.

26.8.09

17:09

depois que a chuva passa o clima fica meio assim, indefinido,
um pouco triste e tímido pela incerteza do que vem pela frente.
e nas ruas as pessoas parecem indiferentes
à dor do homem que acabara de cair...
aliviado e cínico como o palhaço no ato final.

18.8.09

na velha olivetti cansada de palavras tristes

"sim, veneno se toma aos poucos, sorvendo-o lentamente, retratando com elegância aquele instante onde algo se define.
é quase como um bom vinho quando primeiro sente-se o cheiro para depois passar ao primeiro gole.

um bom veneno não deve ser tomado de uma vez só nem ter o tratamento do tiro certeiro, entre os olhos, sempre rápido e indolor."
---
depois de escrever isso na velha olivetti cansada de palavras tristes o escritor dos poemas medianos levou o cálice à boca onde singelas 12 gotas temperavam o drink à base de vodka e suco de laranja... simples assim.

10.8.09

vermelha, vermelho

1.
viu no rosto a lágrima vermelha
que corria, escorria

e borrava a maquiagem de tons azuis e amarelos...
um pouco velha.

espelho partido em oito partes

como o coração vencido,
destroçado, vermelho,

que pulsava como a lágrima

que manchava o all star branco,

agora com detalhes
em vermelho, azul, amarelo...


2.
e respirou pela última vez,

com o coração destroçado e triste

como velho que olha o horizonte

em dia chuvoso.