21.4.07

sozinho como sempre

no último acorde decidiu que não queria mais saber.
tirou o cd do aparelho
e jogou janela abaixo.
tinha decidido.
"rebeldia depois dos trinta não dá".
tava fora.
tomou a última que tinha na geladeira,
fumou o último e foi dormir,
sozinho como sempre.
como sempre.
lá fora tinha um monte igual a ele.
gente que ia e voltava sempre.
gente que não voltava nunca.
acordou.
desesperou-se e desceu as escadas
pra ver se ainda tava lá.
remexeu o mato perto da parede.
achou.
beijou em cima do joey ramone
e subiu desesperado.
ligou o som em toda altura e pediu perdão.
pediu cerveja pelo telefone,
acendeu mais um e decidiu
começar tudo de novo.
lá fora tinha um monte igual a ele.
gente que ia e voltava sempre.

gente que não voltava nunca.

o dia passou a noite veio.
dormiu.

sozinho como sempre.
como sempre.



16.4.07

...e o beijo redentor traria pra ela o momento derradeiro

decidira encontrá-lo no fim do dia,
depois da chuva e do cansaço,
o final feliz.
não haveria mais sol, apenas a lua
e o sereno da noite com poucos respingos
da água acumulada sobre as árvores.
deitaria sobre o banco da praça e esperaria.
não se incomodaria com o tempo,
velho inimigo.
apenas ficaria lá.
fecharia os olhos.
dormiria e sonharia.
e o beijo redentor traria pra ela
o momento derradeiro.



7.4.07

tinha escolhido ser assim

havia uma sombra no asfalto frio de alguém que não era ela. tinha vivido sessenta e cinco anos, muito pouco e as esperanças não mais existiam. não sorria, quase não falava e vivia só. tinha escolhido ser assim, não achava ruim e mesmo naquele instante derradeiro decidiu não se arrepender. lembrou dos homens que não teve, dos amigos que magoou e das chances que desperdiçou. tinha escolhido ser assim. lembrou daquela música que nunca ouviu, do vinho barato que sempre tomou. pestanejou. esperou a hora correta. pensou no último desejo, nas últimas palavras e arriscou um telefonema. linha ocupada. claro. não haveria de ser diferente no derradeiro instante. então, esperou. o dia amanheceu, veio o sol quente, asfalto idem. depois escureceu novamente, amanheceu de novo e o tempo foi passando. esqueceu da fome, da sede, de quase tudo. morreu. sorriu. tinha escolhido ser assim.

2.4.07

amargo

gosto amargo na boca, meio azedo meio sem sal.
dedo na garganta seguido de vômito.
tudo permanece escuro.
e depois?